Poesias




No meu verso sou livre
Dulce Maria Loynaz, Cuba (1903 – 1997)

No meu verso sou livre: ele é o meu mar. 
Meu mar vasto e desnudo de horizontes... 
No meu verso eu ando sobre o mar, 
caminho sobre ondas desdobradas 
de outras ondas e de outras ondas...

Ando em meu verso,
respiro, vivo, cresço 
em meu verso, e nele têm meus pés 
caminho e meu caminho direção e minhas
mãos o que segurar e minha esperança
o que esperar e minha vida seu sentido. 

Sou livre em meus versos e ele está livre 
como eu. Nos amamos. Nos temos. 

Fora dele sou pequena e me ajoelho 
perante a obra de minhas mãos, 
a argila amassada entre meus dedos... 
Dentro dele, levanto-me e sou eu mesma.

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En mi verso soy libre

En mi verso soy libre: él es mi mar. 
Mi mar ancho y desnudo de horizontes... 

En mis versos yo ando sobre el mar, 
camino sobre olas desdobladas 
de otras olas y de otras olas... Ando 
en mi verso; respiro, vivo, crezco 
en mi verso, y en él tienen mis pies camino y mi 
camino rumbo y mis 
manos qué sujetar y mi esperanza 
qué esperar y mi vida su sentido. 

Yo soy libre en mi verso y él es libre 
como yo. Nos amamos. Nos tenemos. 

Fuera de él soy pequeña y me arrodillo 
ante la obra de mis manos, la 
tierna arcilla amasada entre mis dedos... 
Dentro de él, me levanto y soy yo misma.

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Procura-se um amigo
Vinícius de Moraes

Basta ter sentimentos, basta ter coração. 
Precisa saber falar e calar, sobretudo saber ouvir. 
Tem que gostar de poesia, de madrugada, de pássaro, de sol, da lua, 
do canto, dos ventos e das canções da brisa. 
Deve ter amor, um grande amor por alguém, 
ou então sentir falta de não ter esse amor.

Procura-se um amigo 
que saiba guardar segredo sem se sacrificar. 
Pode já ter sido enganado, pois todos os amigos são enganados. 
Deve ter um ideal e medo de perdê-lo 
Tem que ter ressonâncias humanas, 
seu principal objetivo deve ser o de amigo. 
Deve sentir pena das pessoas tristes e compreender 
o imenso vazio dos solitários. 
Deve gostar de crianças e lastimar as que não puderam nascer.

Procura-se um amigo para gostar dos mesmos gostos, 
que se comova, quando chamado de amigo. 
Que saiba conversar de coisas simples, de orvalhos, de grandes chuvas e das 
recordações de infância.

Precisa-se de um amigo para não se enlouquecer, 
para contar o que se viu de belo e triste durante o dia, 
dos anseios e das realizações, dos sonhos e da realidade. 

Deve gostar de ruas desertas, de poças de água e de caminhos molhados, 
de mato depois da chuva, de se deitar no capim.

Precisa-se de um amigo que diga que vale a pena viver, 
não porque a vida é bela, mas porque já se tem um amigo. 

Precisa-se de um amigo para se parar de chorar. 
Para não se viver debruçado no passado 
em busca de memórias perdidas. 
Que nos bata nos ombros sorrindo ou chorando, 
mas que nos chame de amigo, 
para ter-se consciência de que ainda se vive.